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quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Foz do Rio Cebollati ‒ S. Vitória do Palmar (V Parte)

Foz do Rio Cebollati ‒ S. Vitória do Palmar (V Parte)

Hiram Reis e Silva (*), Porto Alegre, RS, 25 de fevereiro de 2015.

O Novo Argonauta
(José Agostinho de Macedo)

Na imensa solidão do mar fremente,
Fanal que aclara a sombra e marca a estrada.
Das ondas mede os Céus e observa os Astros;
Do Sol conhece a altura e conta os passos;
E sem falhar no líquido caminho,
Ao menos marca ao certo a Latitude.



Foz do Rio Cebollati ‒ Baía Pelotas (02.01.2015)

Acordamos cedo e tomamos o desjejum preparado pelo Comandante Pastl, os ventos do quadrante Sul (em torno dos 30 km/h e com rajadas mais fortes ainda) assobiavam ameaçadoramente, parti deixando para trás nosso parceiro Antônio Buzo, que preferiu, neste dia, permanecer embarcado no Zilda III, e o Professor Hélio que ultimava alguns preparativos antes de iniciar a jornada. A primeira parada foi, às 07h15, na Baía Cebollati a 5 km de nosso pernoite. Os ventos tinham baixado o nível da Lagoa em torno de um metro, fotografei a vegetação que adornava as dunas da praia e aguardei o parceiro chegar. Depois de ingerir uma barra de cereal contornamos a Ponta Cebollati, próximo à margem, com certa dificuldade em virtude dos ventos de proa e ondas de até um metro de altura, paramos às 08h20 depois de remar mais 5 km, na raiz meridional da Ponta Cebollati (33°10’12,8”S / 53°38’25,2”O).

Os ventos diminuíam muito o rendimento e afetavam a segurança da navegação, era mais garantido manter os caiaques próximos à margem. O Hélio partiu enquanto eu ainda fazia alguns ajustes no caiaque e já me encontrava longe da margem quando verifiquei que não baixara o leme. Para permanecer próximo à costa, como programara, eu teria de enfrentar ondas de través que no caso do caiaque modelo Cabo Horn, sem o leme, iria gerar um desgaste físico muito grande. O formato em quilha da proa e da popa, embora seja o ideal para cortar a água, deixam o caiaque a mercê das ondas de través, quando estas ondas encontram primeiro a popa fazem a proa virar para a origem das ondas e quando batem na proa a fazem acompanhar o sentido das ondas. Chamei o Hélio para que ele baixasse o meu leme, mas o vento não permitia que ele ouvisse, decidi então continuar enfrentando as ondas de frente, pois esta era a conduta mais adequada à situação, era mais fácil conduzir o Cabo Horn com ondas de proa ou de popa. Estávamos a meio caminho da margem oposta quando percebi que o suporte do leme do Hélio quebrara e o leme era arrastado pelas ondas de um lado a outro. Finalmente o Hélio me ouviu, retirei o leme dele da água e fixei-o no convés e ele baixou o meu. Combinei de aportarmos nas proximidades de uma casa que estava exatamente à nossa proa e achei que ele tinha entendido.

Parece que o Hélio não tinha ouvido minha orientação e se afastava lentamente para bombordo até sumir de vista. Achei que o amigo estava à deriva em decorrência da falta do leme. Demorei a alcançar a margem da Baía Magra, próximo à casa que tomara como referência (33°13’18,2”S / 53°39’30,1”O), e imediatamente subi na duna mais alta tentando avistar o Hélio e como não conseguisse comuniquei-me, pelo rádio, com a equipe de apoio. O Comandante Reynaldo di Benedetti informou-me que eles tinham decidido permanecer na Foz do Cebollati em virtude dos fortes ventos e tiveram de mudar a programação para tentar achar o Hélio. Inicialmente o Coronel Pastl me pedira para permanecer naquela posição, mas aflito, depois de um vinte minutos parado, decidi costear a Baía Magra, protegido dos ventos, na tentativa de encontrar o Hélio. Não encontrei meu parceiro e nas proximidades da Ponta Magra aproveitei que a direção dos ventos coincidia com a da Ponta e surfei velozmente por uns 3 km. Logo depois de ultrapassar a ponta avistei o Hélio navegando algumas centenas de metros à frente e novamente o vento impediu que ele me escutasse. Fiz uma parada para tentar avisar a equipe de apoio que estava tudo bem, mas não consegui apesar de subir nas árvores mais altas, hidratei-me e continuei. Mais à frente enxerguei o Hélio novamente e, desta vez, ele me viu, parei imediatamente, subi na duna mais alta das proximidades e consegui contatar o Coronel Pastl que me repassou as coordenadas da Foz de um pequeno Arroio (33°17’57,1”S / 53°35’31,0”O) que infelizmente estava totalmente assoreado e tivemos de ir mais adiante. Fomos até um canal de irrigação (33°19’26,4”S / 53°36’11,8”O) que também não se mostrou viável, estacionamos, então, um pouco adiante do canal onde fizemos uma sondagem do local e, embora fosse mar aberto, a fantástica vegetação nativa oferecia uma certa proteção dos ventos, agora moderados, que sopravam de SO.

Montamos acampamento sob uma bela corticeira (Erythrina crista-galli), estendemos nossas roupas molhadas sobre uns sarandis, fiz um tour pelo local documentando a bela região onde encontrei uma lebre, muito mansa, que perambulava pela praia sem se importar com minha presença. A espessura das camadas de conchas nas praias varia muito, mas encontramos, em alguns lugares, algumas com mais de 30 cm. Foi uma jornada curta, de apenas 37 km, mas satisfatória, considerando as condições adversas e imprevistos.

Baía Pelotas ‒ Santa Vitória do Palmar (03.01.2015)

O Hélio e o Antônio partiram e eu permaneci para fotografar a praia, de meu caiaque, aproveitando o ângulo de incidência do Sol. Apontei a proa, às 07h15, para a Ponta Pelotas aonde cheguei trinta minutos depois. Avistei os amigos canoístas logo à frente, mas parei para documentar a Ponta Pelotas e logo em seguida, novamente, era sem dúvida uma das regiões mais belas de toda a Lagoa Mirim que até então percorrêramos, continuei fotografando a vegetação curiosamente moldada pelos ventos sem acostar.

 Às 09h40 passamos por um casal de capororocas (Coscoroba coscoroba) e às 09h50 aportamos na Foz do Arroio Costa de Pelotas (Foz ‒ 33°27’31,0”S / 53°35’29,5”O), sem dúvida o mais esplendido dos afluentes de toda a margem Oriental da Lagoa Mirim. Além da mata nativa consegui fotografar um filhotão de cabeça seca ou jaburu-moleque (Mycteria americana). Não consegui, naquela oportunidade, identificar a espécie e tive de recorrer ao usuários do Wikiaves para identificá-la. Nas minhas pantaneiras andanças eu tinha observado bandos de cabeças secas, mas como não era época da nidificação destas aves, não avistei, na época, nenhum filhote.

Meus parceiros tinham partido, já há algum tempo, para encontrar os velejadores quando embarquei no meu Cabo Horn. Como eles já estavam a meio caminho costeando a Baía, resolvi apontar minha proa diretamente para a Ponta San Luis onde se encontrava o veleiro Zilda III antes de adentrar na Boca do San Luis (33°31’29,9”S / 53°32’36,8”O). Almoçamos e decidimos fazer apenas uma pequena incursão no Saco de San Miguel, aproamos para o Sul, passando pela Ponta de Las Piedras e Ponta Montenegro e depois para NE pela Ponta do Paraguaio, às 13h40. Aportei na Ponta para descansar e meus parceiros resolveram tocar direto para o porto de Santa Vitória do Palmar ante a possibilidade dos ventos aumentarem. Embarquei no Cabo Horn e depois de contornar a Ponta do Paraguaio verifiquei que a rota seguida pelos companheiros apontava muito para o Sul, aproximei-me deles e o Hélio me informou que o Antônio assim preferira. Decidi aproar direto para o porto onde o veleiro nos aguardava e lá chegando ajudei-os a aportar em segurança no canal que fica ao Sul do porto. Novamente eu tinha de checar algumas revisões encaminhadas pela PUCRS e precisava acessar a internet. Acompanhei o Comandante Reynaldo di Benedetti e o Professor Hélio Bandeira, no taxi do Brizola, e fomos diretamente para uma sorveteria – o Comandante, como eu, tem apenas um vício ‒ sorvete. Depois de degustarmos generosas porções fomos reservar um hotel para mim e depois ao super-mercado. Deixamos as compras no veleiro e voltei sozinho de táxi para o hotel. Foi uma jornada de 48 km.



Fonte: MACEDO, José Agostinho de. O Novo Argonauta – Portugal – Lisboa – Oficina de António Rodrigues Galhardo, Impressor do Conselho de Guerra, 1809.



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